Reproduzo abaixo a matéria de Igor Senra*, publicada na revista Época Negócios, no dia 21/02/2020.
Estatísticas comprovam: em infraestrutura, 47 mil pessoas morrem no trânsito por ano; sem segurança, 43 mil pessoas são mortas por arma de fogo por ano; gasta-se em proporção do PIB em saúde o equivalente a países europeus, porém, a nossa expectativa de vida é uma das mais baixas da América Latina. Na área da educação, 27% de jovens entre 19 e 24 anos não estudam nem trabalham; a produtividade do brasileiro corresponde a 24% da de um norte-americano; e no ranking do empreendedorismo, o Brasil está na posição 109º dos 190 países mais fáceis para se fazer negócio.
Sabemos que, infelizmente, o Brasil está quebrado e é impossível esperar uma solução do Estado para quaisquer dos nossos mais diversos problemas, uma vez que ele mal consegue pagar sua folha de pagamento e as aposentadorias.
Nos últimos anos, desperdiçamos tempo. Uma visão de país para 2030 desenhada por especialistas e que traz uma série de propostas de políticas públicas visando dobrar a renda per capita em 2030 deixa claro o quão pouco avançamos e o preço que milhões pagarão em razão dessa complacência. Dobrar a renda per capita, nos tornando um país de alta renda e menos desigual, se tornaria possível só em 2081, caso o ritmo de crescimento dos últimos 25 anos fosse mantido.
Nossa sociedade precisa avançar e nós temos pressa!
A saída pode estar na iniciativa privada. Empreender é achar nos problemas uma oportunidade de negócio. Portanto, nós, os empreendedores, vivemos um momento muito rico. Temos a oportunidade de escolher como vamos reconstruir o Brasil a partir dos nossos sonhos.
Deveríamos canalizar nossa energia empreendedora para elencar, no meio dessa abundância de problemas, aqueles que combinam uma grande oportunidade de negócios a uma chance real de consertar o país. Esses são os chamados Negócios com Propósito.
Esse novo modelo capitalista é uma forte tendência mundial e já temos bons exemplos por aqui.
Um dos gargalos para o empreendedor brasileiro, no entanto, está na gestão da operação financeira de sua empresa. Ele acaba consumindo tempo do que deveria com a gestão financeria, em vez de se dedicar às atividades principais daquele negócio. Isso acontece pela falta de conhecimento, que gera confusão, e aí, o tempo perdido. A falta de apoio financeiro e a ausência de soluções simples e acessíveis impedem o crescimento das empresas. Instituições bancárias que, invés de orientar, acabam confundido os empreendedores que são especialistas nos seus negócios, e não em gestão de empresas. Quando eles puderem contar com serviços financeiros mais eficazes, a economia do Brasil vai alavancar. Serviços que possibilitem a automatização de tarefas, que ajudem na desburocratização, que tenham até um espaço para aconselhamento, que ofereçam um bom atendimento e que apresentem uma interface amigável. O que está fora do padrão precisa ser fácil para adaptação.
A imagem da indústria financeira se deteriorou muito nas últimas décadas e ela foi a grande responsável por isso, pois as empresas financeiras têm se preocupado mais em servir a si próprias do que ao melhor interesse dos clientes. Mas nós acreditamos no impacto que os serviços financeiros podem ter na sociedade e que a combinação entre empreendedores e finanças pode acelerar nosso crescimento e prosperidade. O Banco Central do Brasil está tomando medidas para facilitar que novos entrantes possam oferecer serviços financeiros. As maquininhas de pagamento são outro exemplo. Elas se transformaram em uma ferramenta praticamente fundamental para o empreendedor não perder vendas, uma vez que a maioria dos consumidores já preferem essa forma de pagamento. Há diversas opções disponíveis no mercado, sejam as de terminal fixo, mais caras, sejam as de cartão móvel e portáteis, mais baratas, geralmente dispensando aluguel do aparelho.
Acreditamos que o empreendedorismo brasileiro pode ser a verdadeira mola propulsora para a recuperação do país. Isso vai acontecer quando empreendedores tiverem à sua disposição serviços financeiros simples, transparentes e acessíveis, que ajudem eles e suas empresas a entender as informações financeiras e, assim, tomar melhores decisões, e que permitam que o acesso ao capital seja uma fonte de crescimento sustentável.
*Igor Senra é fundador da Cora, empresa que oferece soluções financeiras voltadas exclusivamente para pequenos e médios negócios.
Sempre gostei da atuação do Banco Central do Brasil e, com a publicação do edital de consulta pública 75/2019, sou cada vez mais fã do regulador.
Acompanho o Bacen desde 2001, com a implantação do SPB. Na época, como executivo da Redecard e membro da ABECS, tivemos diversas interações com o Banco.
No início o Bacen parecia ter uma equipe muito radical, interessada em “quebrar ao qualquer custo” todas as barreiras, com a clara visão de aumentar a competição, trazendo inovação e reduzindo os custos do sistema. Embora o discurso parecesse radical, suas intenções sempre foram muito boas, entretanto, não tinha o poder para fazê-lo.
Durante os anos 2000, entre os participantes do mercado, havia um claro entendimento que nenhum setor gosta de ser regulado, mas se não houvesse alternativa, que fosse o Banco Central, ao invés do Congresso, afinal agem de forma técnica e não política.
Somente a partir da promulgação da Lei nº 12.865, de 9 de outubro de 2013, que o Bacen passou a ser o agente regulador do sistema de pagamentos no varejo. Desde então temos visto uma atuação impecável (embora há quem discorde) do Banco Central. Sempre consultando e ouvindo todos os participantes do mercado, antes de emitir suas regras.
No dia 16/12/19, publicou o edital de consulta pública 75/2019, colocando em discussão proposta de circular que altera o Regulamento anexo à Circular nº 3.682, de 4 de novembro de 2013, para disciplinar a modalidade de arranjo de pagamento de “saque e aporte” no âmbito dos arranjos integrantes do Sistema de Pagamentos Brasileiro (SPB). Os caixas eletrônicos são os principais veículos para a prestação de serviço de saque e de aporte.
Revendo as mudanças e evolução do sistema de pagamentos dos últimos 5 anos, é perceptível um aumento significativo da concorrência, inclusão financeira, acesso dos MEIs (Micro Empreendedor Individual) ao sistema, redução dos custos, etc.
Houve uma explosão na oferta contas de pagamento (alternativa à conta bancária), contas digitais, carteiras eletrônicas (com QR Code ou NFC) e cartões pré-pagos.
Uma conta de pagamento, com um cartão pré-pago ou carteira eletrônica, parece ser o instrumento perfeito para substituir o papel moeda, melhorando a conveniência e segurança para um segmento importante da sociedade. De acordo com o Bacen, o dinheiro ainda é a forma de pagamento utilizado com maior frequência por cerca de 60% da população brasileira. Entretanto, a alternativa ao papel moeda ainda enfrenta algumas barreiras e a principal delas são os custos de saque e aporte.
Depositar ou sacar dinheiro de uma conta de pagamento implica em um certo trabalho e custos adicionais. Como em geral os provedores de contas de pagamento não possuem lojas físicas, aportar valores nas contas significa fazer uma transferência bancária (TED/DOC de uma conta bancária) ou pagar um boleto bancário com o valor que se deseja depositar. O saque poderia ser diferente, já que temos no Brasil uma excelente infraestrutura, que inclui um número significativo de caixas eletrônicos. Entretanto, o acesso ao sistema é restrito e exige um pagamento por saque que, muitas vezes, torna o sistema inviável para o consumidor.
Como disse o Bacen, há evidências de que os bancos digitais, os emissores de moeda eletrônica e mesmo bancos tradicionais de menor porte, por não disporem (ou disporem de forma muito limitada) de canais de atendimento presenciais, têm enfrentado custos elevados para dar acesso a esses serviços para seus clientes.
Com a nova regulação, proposta pelo BC, espera-se corrigir essa distorção, nivelar as condições concorrenciais entre agentes e aumentar a competição no Sistema Financeiro Nacional e no SPB.
Um relatório da Juniper Research mostra que o uso do reconhecimento facial, seja baseado em hardware ou software, está ganhando terreno na autenticação de pagamentos baseada em biometria.
De acordo com o relatório, a autenticação biométrica será usada para garantir US$ 2,5 trilhões em transações de pagamento móvel até 2024, um aumento de quase 1.000% em relação aos US$ 228 bilhões que deverão ser transacionados através do método até o final de 2019.
Biometria de hardware genérica que gera consciência, não uso
A nova pesquisa, “Mobile Payment Authentication & Data Security: Encryption, Tokenisation, Biometrics 2019-2024“, mostra que a disponibilidade de hardware biométrico dedicado não será um obstáculo ao uso biométrico, uma vez que estará presente em cerca de 90% dos smartphones até 2024. No entanto, acreditam que menos de 30% desses telefones sejam usados para autenticar pagamentos sem contato, devido à presença de cartões sem contato.
O relatório também mostra que o uso do reconhecimento facial, seja baseado em hardware ou software, está ganhando terreno na autenticação de pagamento baseada em impressões digitais. A Juniper Research acredita que, devido à onipresença das câmeras de smartphones e à capacidade de utilizar plataformas de biometria como serviço com base em software, elas atingirão um nível de uso semelhante ao da biometria de hardware dedicada nos próximos 5 anos.
Padrões para levar a biometria para navegadores móveis
O relatório observa que existem vários padrões e protocolos de pagamento entrando em vigor no futuro que aumentarão o uso da biometria móvel. Mais particularmente, o requisito do 3D Secure 2.0 para autenticação de dois fatores levará os comerciantes a adotar biometria para tornar a experiência de pagamento mais suave (sem atrito) em uma variedade de plataformas.
“A biometria tem sido tradicionalmente usada para pagamentos pessoais sem contato”, observou o autor da pesquisa James Moar. “No entanto, com um aumento na necessidade de autenticação sem atrito em todos os canais de mCommerce, prevemos que mais de 60% dos pagamentos biometricamente verificados serão feitos remotamente até 2024”.
No entanto, o relatório mostra que isso se limitará principalmente a dispositivos Android, pois o iOS atualmente não suporta autenticação WebAuthn.
Os setores financeiro e de meios de pagamento passam por processos de disrupção em ritmo acelerado. Novas tecnologias como inteligência artificial, machine learning, blockchain, big data, processamento na nuvem, APIs, IOT, UX, mídias sociais, chat bots, realidade aumentada, wearables, biometria, entre outras, impulsionaram o surgimento de empresas dedicadas a aprimorar a experiência e o processo de compra do consumidor, bem como otimizar e transformar processos e modelos de negócio existentes. O uso intensivo das tecnologias digitais, associado à disseminação dos smartphones, intensificou o efeito de desmaterialização de ativos, em que objetos físicos são cada vez mais substituídos por ativos digitais, através de aplicativos no celular, fomentando inovação e desintermediação.
Com as novas tecnologias e as transformações exponenciais, novos modelos de negócio e processos digitais surgem, permitindo que startups e empresas estabelecidas aprimorem a relação com seus clientes e operem de forma mais enxuta, com ativos, equipe e custos fixos reduzidos, em um modelo de operação conhecido como “asset light”. O ritmo intenso das mudanças, não observado antes em termos comparativos, fez com que a transformação passasse a ser um ato contínuo na agenda estratégica das empresas, trazendo o desafio de alinhar pessoas e ajustar a cultura a novos paradigmas.
No setor bancário, os bancos digitais iniciaram o processo de transformação da indústria, oferecendo uma proposta de valor disruptiva e trazendo um novo conceito de banco, com modelos de negócio ágeis e escaláveis, oferecendo contas digitais com tarifas reduzidas (ou zero) como porta de entrada para a oferta de um portfólio de serviços e produtos financeiros customizados através do uso intensivo de dados.
Na área de meios de pagamento, o processo de transformação da indústria ocorreu a partir de 2010, quando houve o fim da exclusividade entre a credenciadora Visanet e a bandeira Visa (a exclusividade entre Mastercard e Redecard terminou em 2001). A partir de 2013, o processo de mudança se acelerou. Com a Lei n° 12.865/2013, o Banco Central instituiu o marco regulatório no setor com a criação dos arranjos de pagamento e instituições de pagamento, levando a um crescente aumento na quantidade de empresas participantes desse mercado, gerando maior competição, inovação e pulverização dos serviços oferecidos. Desde então, o mercado vem passando por sucessivas evoluções regulatórias, acarretando aumento da concorrência. As circulares de liquidação centralizada (BC Circular nº 3.765/2015) e o marco para subcredenciadores (BC Circular nº 3.886/2018) são exemplos desse movimento.
O Brasil apresenta um crescimento exponencial de fintechs. Segundo o site Radar Fintech, existem 529 startups financeiras em operação no Brasil, 151 apenas no setor de pagamentos, com soluções que melhoram as relações de compra e venda, reduzindo atrito, aproximando compradores e vendedores, tornando o pagamento ágil, simples, conveniente e transparente.
Com o surgimento e crescimento das fintechs, o chamado modelo tradicional de quatro partes do mercado de cartões, composto por bandeiras, bancos, credenciadoras e varejistas, também passa por uma transformação. As transferências instantâneas “peer-to-peer” e o QR Code criam alternativas de fluxo aos modelos tradicionais de pagamento, obrigando as empresas estabelecidas a repensarem seu modo de atuação. Como exemplo, as bandeiras de cartão, historicamente responsáveis por manter os ambientes de integração entre bancos e credenciadoras, estão abrindo as suas plataformas de forma colaborativa através de APIs para que fintechs desenvolvam soluções inovadoras. Investimentos estratégicos em fintechs, programas de aceleração e hackathons entraram definitivamente na agenda dessas empresas.
Em 2018, o Conselho Monetário Nacional regulamentou, através da Resolução nº 4.656, o funcionamento das empresas de tecnologia financeira que operam no mercado de crédito e criou duas opções de atuação: a Sociedade de Crédito Direto (SCD) e a Sociedade de Empréstimo entre Pessoas (SEP). Com regras específicas e modelos de operação definidos, a regulamentação modernizou e permitiu a inovação no mercado de crédito, estimulando a competição e representando mais um passo no longo caminho de redução do custo de crédito e do spread bancário no Brasil. As fintechs inovaram no tempo de aprovação do crédito. Utilizando processos ágeis, estruturas enxutas e sob um guarda-chuva regulatório mais simples, elas utilizam tecnologias de inteligência artificial e machine learning, em conjunto com fontes tradicionais e alternativas de dados, para traçar o perfil individual do cliente, reduzindo riscos e melhorando a experiência do processo como um todo. Apesar das taxas oferecidas serem inferiores às dos bancos, o volume de crédito concedido por elas ainda é pouco significativo em relação ao mercado, o que, em parte, se justifica pelo processo de amadurecimento do modelo de negócio e por questões de funding para a operação.
Como um próximo e importante passo regulatório e tecnológico, o Banco Central anunciou que lançará o serviço de pagamentos instantâneos até 2020. Nele, os recursos da transação entrarão na conta do fornecedor em tempo real, através de uma liquidação centralizada no próprio BC. Os pagamentos poderão ser feitos através de telefones celulares e QR Codes, dispensando o uso das maquininhas (“desintermediação”), reduzindo os custos para comerciantes e participantes do sistema.
Em preparação para este novo cenário, cresce o número de carteiras digitais (“wallets”) e dos chamados “super aplicativos” para pagamentos, transferência de valores e outros serviços, bem como a disputa pelo uso e pela fidelidade do cliente. Empresas de varejo, tecnologia, delivery e bancos lançam produtos com o objetivo de influenciar e antecipar a mudança de hábito dos consumidores e das novas gerações. São exemplos de iniciativas: Ame Digital, Iti, PicPay, Magalu Pagamentos, RecargaPay, iFood Pay, Rappi Pay, banQi, Interpag, entre outros.
No epicentro destas transformações estão inseridos os conceitos de centralidade no cliente e estratégia digital. O consumidor terá diversas alternativas para realizar pagamentos e gerir a sua rotina financeira, e utilizará aquela que considerar mais conveniente e vantajosa, dependendo do seu perfil, necessidade e momento da compra. As fintechs aumentaram a “barra” do mercado nos quesitos de experiência do cliente na jornada de compra e em novos modelos de negócio (alguns ainda com desafios de sustentabilidade financeira), mas esse movimento foi essencial para a indústria que vem gradativamente aumentando, também, a sua “barra” em como fazer negócios e atender aos clientes.
A crença de que “incumbentes devem encontrar inovação antes que fintechs encontrem distribuição” evoluiu. Bancos, adquirentes e bandeiras ajustaram as suas estratégias e desenvolveram o espírito de “fintechs”, identificando os principais pontos de atrito em suas operações, reorganizando estruturas e equipes em squads, buscando soluções ágeis e centradas no cliente, com equipes multidisciplinares, uso intensivo de tecnologia e ciclos rápidos de criação, feedback e melhoria. E foram além, deixaram o conceito de competição “pura” com as fintechs como a única alternativa, e seguiram para a colaboração e co-criação. Espaços como Cubo e Inovabra, bem como, os inúmeros investimentos feitos por empresas incumbentes em fintechs, são exemplos desse movimento.
Ainda no contexto das mudanças regulatórias, a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (Lei n° 13.709/2018), já presente em países da Europa através da GDPR, entrará em vigor de forma plena em meados de 2020, o que pressiona as empresas a se prepararem, desde já, para lidar com os seus efeitos.
Por fim, o movimento de “Open Banking”, que já é usado e regulamentado na Europa desde janeiro de 2018, através do PSD2, está em implantação no Brasil. Em 24/04/2019 o Banco Central divulgou as diretrizes para o Sistema Financeiro Aberto (“open banking”), com expectativa de implantação a partir do segundo semestre de 2020.
Uma série de transformações estão em curso nos mercados financeiro e de meios de pagamento levando à maior concorrência, eficiência e melhoria dos serviços. E então as empresas questionam o que deve ser feito. Como antecipar tendências que surgem no mercado? Como entregar propostas de valor vencedoras aos clientes? A resposta não é direta, nem única. Em um cenário de transformação contínua, as respostas também devem ser contínuas e, para atingir respostas e entregas contínuas, em ciclos rápidos e alinhados às mudanças, as empresas precisam estar próximas aos clientes, entender as suas necessidades, e usar intensamente tecnologia e análise de dados para atender às suas novas e crescentes expectativas. O impacto das mudanças começou e o resultado será a construção de um ecossistema financeiro e de pagamentos mais pujante, eficiente e ágil. Transformação e inovação contínuas já são o novo “normal”.
* Luis Filipe Cavalcanti – Executivo e empreendedor com 15 anos de experiência no mercado de meios de pagamento. Foi sócio da Muxi Tecnologia em Pagamentos S/A, onde ocupou a posição de CEO, além de diversas posições de direção executiva. Trabalha como consultor de empresas e fintechs nas áreas de estratégia, produtos e tecnologia. Engenheiro pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, com Mestrado em Engenharia de Sistemas e Computação pela COPPE/UFRJ e MBA pelo MIT Sloan School of Management.
Os sistemas de pagamento estão evoluindo em um ritmo exponencial para uma direção de mundo cada vez mais rápido, interoperável, inclusivo, online e centrado na experiência do usuário. Novas tecnologias e modelos de negócios deverão, em apenas alguns anos, mudar drasticamente como são feitas as transferências e compras diárias.
Entre essas inovações, o destaque é para os Pagamentos Instantâneos: pagamentos que são autorizados e liquidados em tempo real, disponíveis 24 horas por dia, 7 dias por semana, e normalmente precisam apenas de um aplicativo no celular e um código QR. O Banco Central iniciou ano passado um projeto para implementar um ecossistema de Pagamentos Instantâneos (SPI) no Brasil até final de 2020.
Quais os principais problemas dos pagamentos tradicionais que podem ser solucionados pelos pagamentos instantâneos?
– Utilização elevada de dinheiro em espécie: Embora o uso do dinheiro físico esteja diminuindo, ainda representa mais de um terço do consumo privado brasileiro, segundo o relatório sobre Meios de Pagamento da Fisher. O pagamento em espécie, no entanto, gera custos desnecessários com a criação, logística e a destruição do numerário, além do custo imensurável relativo à facilitação da lavagem de dinheiro, da corrupção (quase inexistente a rastreabilidade) e da sonegação de impostos.
– Alto custo e dificuldade de transferências eletrônicas interbancárias: O DOC e a TED, principais formas de transferir dinheiro, contam com tarifas muito elevadas. Além disso, há uma enorme quantidade de informações (nome, CPF, banco, agência e conta) que o usuário é obrigado a preencher para identificar o destinatário dos recursos, aumentando as possibilidades de erros de identificação, ou seja, uma péssima UX (User Experience) de pagamento.
– Alto custo de bandeiras de cartão: Cartões de crédito e débito possuem custos de aceitação muito elevados para os vendedores e os recursos demoram um tempo significativo para serem recebidos na conta.
Vale ressaltar que os pagamentos instantâneos não apenas oferecem a solução ideal para esses três problemas, como também oferecem uma série de vantagens para os seus usuários.
Qual a relação de QR Code com Pagamentos instantâneos?
Os pagamentos instantâneos tornam desnecessário guardar dados como números de conta e agências de bancos e ainda permitem com que seja possível realizar o endereçamento das transações com o simples uso de um smartphone aliado a dados corriqueiros, como: e-mail, CPF, número de celular, ou pela leitura de um QR Code.
Essa tecnologia pode ser utilizada por qualquer usuário, seja ele uma empresa ou pessoa física, e a movimentação dos recursos das contas sempre fica disponível em segundos para o recebedor.
E quando falamos de QR Code para pagamento já podemos ver o começo dessa tendência com o crescente número de carteiras digitais surgindo em diferentes segmentos, como: Ame (Grupo B2W), carteira Mercado Pago (Grupo Mercado Livre), carteira Ifood (Grupo Movile), carteira de benefícios corporativos Alymente, carteira Rappi, carteira Payly (Grupo Cosan), Cielo Pay, Swipe (empresa especializada em tecnologia para carteira digital), carteira Iti (Grupo Banco Itaú), InterPag (Grupo Banco Inter) e Pic Pay (Grupo Banco Original). Inclusive, existem em São Paulo estabelecimentos que dão a sensação das lojas na China: QR Codes dispostos por todo o balcão.
Foto tirada em 22/08/2019 na Vila Olímpia em São Paulo
Outro ponto evidente no boom das carteiras digitais, revela-se na grande competição para conquistar o usuário final. As companhias utilizam-se de diferentes recursos para tanto: cashback (devolvem parte do dinheiro gasto na compra), descontos imediatos na conta e programas de fidelidade agressivos.
A foto acima lembra o mercado de pagamentos brasileiro antes da Lei 12.865/13 (regulamentou o setor brasileiro de meios de pagamento eletrônico), no qual os lojistas deveriam ter diferentes POS (máquinas de cartão) para aceitar diferentes bandeiras (bandeira Visa somente era aceita nas POS da Visanet e a bandeira Mastercard somente na Redecard). Essa mesma situação observa-se no mercado atual de carteiras digitais, uma vez que, o lojista deve ter todos os QR Codes para conseguir aceitar as diferentes carteiras.
Pagamentos Instantâneos tem o objetivo de permitir o pagamento imediato e transparente entre usuários de diferentes carteiras, desta maneira o lojista apenas faria uso de uma carteira/QR Code para conseguir receber pagamentos de todas as carteiras.
Assim, a indústria de meios de pagamento está mais perto da verdadeira interoperabilidade e inclusão financeira, que estimulam o desenvolvimento de soluções inovadoras aos desafios do mercado tradicional.
Quais as principais vantagens dos pagamentos instantâneos para as empresas?
Redução ou remoção das taxas de transação: devido ao grande número de intermediários, que tomam fatias das transações financeiras, os preços atuais para a aceitação de pagamentos com cartão online são altas.
O uso do Open Banking aliado a pagamentos instantâneos por novas empresas reduzirá o valor das taxas e deve gerar outras formas de monetização, como novas oportunidades baseadas no uso de dados, que podem até mesmo eliminar a necessidade dessa cobrança.
Aceitação em diversos canais: como os pagamentos instantâneos podem ser realizados com o simples uso de um celular aliado a algum dado identificador, isso faz com que seja muito fácil para que qualquer negócio realize transações financeiras com qualquer pessoa.
Além disso, os pagamentos instantâneos eliminam o risco de os comerciantes online não serem pagos, porque a liberação de mercadorias e serviços pode ser facilmente sincronizada com a realização do pagamento.
Já para pagamentos business-to-business, os pagamentos instantâneos melhoram o fluxo de caixa, facilitam o gerenciamento de fundos, reduzem atrasos nos pagamentos e aceleram o pagamento de faturas.
Quais as principais vantagens dos pagamentos instantâneos para os consumidores?
Facilidade de uso e inclusão financeira: a possibilidade de enviar e receber pagamentos instantâneos a partir de um smartphone pode funcionar como um enorme incentivo para que pessoas acessem serviços financeiros.
De acordo com dados divulgados pelo Banco Central, 96% da população brasileira ainda utiliza dinheiro físico e considerando que já existe mais de um smartphone por habitante no país que significa mais de 220 milhões de celulares ativos, o uso de pagamentos instantâneos através do celular pode representar níveis sem precedentes de inclusão financeira e um salto de crescimento explosivo para novos negócios.
Crédito instantâneo e barato no checkout: a rapidez e segurança em relação a identidade do usuário nos pagamentos instantâneos aliadas a uma boa regulamentação do BC podem criar oportunidades de novos modelos de mercado com o oferecimento de crédito de maneira instantânea para os consumidores.
Isso também possibilitaria que diversas instituições financeiras, de bancos a novas fintechs, competissem em tempo real para analisar os dados do consumidor e oferecer o melhor preço para esse crédito.
Futuro promissor para as empresas que se dedicarem a esses novos modelos de negócios
Com lançamento previsto para o final de 2020 no Brasil, os pagamentos instantâneos oferecem diversas oportunidades de negócio para empresas da indústria de meios de pagamento. Reforçando esse caminho, o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, em pronunciamento para o Senado Federal, afirmou: “O mundo passa atualmente por uma onda de inovação e mudanças. É crucial […] preparar o Banco Central do Brasil para desempenhar apropriadamente suas funções nesse novo ambiente, que será certamente baseado em tecnologia e no fluxo rápido de informações. Novas tecnologias como Blockchain, o uso de inteligência artificial, identidade digital, Pagamentos Instantâneos, open banking, dentre outras inovações, estão alterando completamente os modelos de negócios e os serviços financeiros.”
Posicionar-se da maneira correta é a chave para aproveitar ao máximo os benefícios dessa nova tendência, preservar o atual marketshare ou expandir o mercado com novas soluções.
Marcelo Martins é formado em Economia no Insper, Direito na PUC-SP e cursando especialização em Gestão de Produto Digital na University of Alberta. Foi Product Manager na Wirecard Brasil e Diretor de Produto na StarPay. Atualmente é especialista em inovação para indústria de Meios de Pagamento na Pay Ventures (conteúdo especializado e consultoria estratégica) e CPO na Blockforce. Co-Founder e especialista em Pagamentos nas Fintechs: Swipe (tecnologia para carteiras digitais) e Alymente (carteira digital de benefícios corporativos). Participa do grupo de trabalho do Banco Central sobre Pagamentos Instantâneos, dos grupos de Open Banking e Pagamentos Intantâneos da ABFintech e da Anjos do Brasil.
Matéria de Felipe Matos, publicada no Estadão de 15/07/19.
Na última terça-feira (10), o presidente da república sancionou a lei que cria a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD), um órgão voltado para proteger as informações pessoais tratadas em território brasileiro, que vinha sendo bastante aguardado por startups e empresas do setor de tecnologia – em continuidade à implementação da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). Nesse artigo, que contou com a contribuição da advogada especializada no tema Raíssa Moura, trazemos uma análise dos principais pontos que afetam startups.
A criação do órgão havia sido prevista inicialmente LGPD, mas foi vetada pelo presidente, que sinalizou que o criaria futuramente através de um decreto. Posteriormente, a presidência propôs uma Medida Provisória (869/2018) com alguns pontos de regulamentação da lei, mas que, por sua natureza provisória, trazia inseguranças sobre a sua efetiva validade. Finalmente, desde semana passada, foi publicado um decreto no Diário Oficial da União, dando uma versão definitiva à regulamentação, com 14 vetos ao texto original, e determinação da criação da autoridade reguladora, além de mais algumas mudanças, com impacto significativo para as empresas.
O que muda para as startups?
O ambiente das startups de tecnologia e inovação é movido por enxergar oportunidades e criar soluções para problemas conhecidos e mesmo alguns que sequer haviam sido imaginado. Cada vez mais, essas empresas utilizam a ciência de dados em seus produtos e serviços como parte de suas soluções. A aprovação da LGPD, de fato, mudará bastante o modelo de operação dessas startups ao implicar umas série de processos de proteção dos dados, inclusive regulando quando será necessário o pedido de consentimento dos consumidores para coleta e tratamento desses dados.
Por isso mesmo, a complexidade da tarefa também é uma oportunidade valiosa para quem quer inovar na área. Agora, existe espaço para que novas soluções surjam implementando políticas de gestão e segurança de dados e consentimentos, colocando a questão da privacidade presente desde a concepção das soluções, o chamado privacy by design.
Ainda assim, muitos empreendedores estão com o medo do custo da implementação da LGPD, afinal, startups possuem poucos recursos no início e desenvolvem seus negócios. O desafio aqui será equilibrar a proteção dos dados pessoais e o direito fundamental à privacidade com o desenvolvimento econômico e a inovação, permitindo que as startups brasileiras mantenham seu crescimento exponencial em condições de competir com as gigantes da tecnologia do mercado digital internacional.
Neste sentido, é importante analisarmos as mudanças estabelecidas pela Lei 13.853, sancionada esta semana, e identificar quais os principais impactos para as startups, conforme veremos a seguir.
Principais benefícios da ANPD:
1. A instituição reguladora:
O Brasil contará com uma Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD), órgão responsável por zelar, implementar e fiscalizar o cumprimento da LGPD. Este é o passo fundamental para que o país finalmente tenha o mesmo nível de proteção de dados de países que saíram na frente e já implementaram suas leis. Esse ponto é importante, pois numa nua economia digital sem fronteiras, ocorre um grande fluxo internacional de dados. Por isso é preciso harmonizar regras sobre a gestão desses dados entre países – em especial com a GDPR (General Data Protection Regulation), que é a legislação européia que trata o tema.
Além do mais, a ANPD será responsável por auxiliar as empresas em seus processos de adequação ao instituir diretrizes claras sobre o tratamento de dados pessoais, promover o conhecimento das normas e políticas públicas sobre proteção de dados, elaborar estudos sobre práticas nacionais e internacionais de proteção de dados e auxiliar o entendimento sobre os procedimentos adequados para a elaboração dos relatórios de impacto à proteção de dados, dentre outras atividades que facilitarão a interpretação da lei.
2. O Conselho Nacional de Proteção de Dados Pessoais e da Privacidade:
A Autoridade Nacional de Proteção de Dados terá um Conselho Nacional de Proteção de Dados Pessoais e da Privacidade formado por 23 membros, dentre eles representantes de instituições científicas, tecnológicas, de inovação e entidades empresariais relacionadas à área de tratamento de dados pessoais, que não terão poder decisório, mas poderão, entre outras atribuições, propor diretrizes estratégicas e fornecer subsídios para a elaboração da Política Nacional de Proteção de Dados Pessoais e da Privacidade, bem como recomendar ações para a ANPD, além de elaborar estudos e realizar debates públicos sobre o tema.
Portanto, as startups poderão ter representação no Conselho Nacional de Proteção de Dados Pessoais e Privacidade, garantindo que a ANPD cumpra com o disposto no art. 2º da LGPD, que institui como um dos fundamentos da lei o desenvolvimento econômico, tecnológico e a inovação.
3. Os termos de compromisso:
A ANDP poderá celebrar termos de compromisso com as empresas. Isto significa que há a possibilidade da ANPD fazer recomendações para que as startups se adequem à lei, firmando um termo de compromisso, que deverá ter seu cumprimento fiscalizado pela própria autoridade, sem que as punições previstas na LGPD inviabilizem negócios que estão em estágio inicial de desenvolvimento. Esta é a melhor forma da ANPD educar o mercado e alcançar o fim máximo da lei que é garantir a proteção dos indivíduos diante do tratamento dos seus dados pessoais identificados ou identificáveis.
4. Normas específicas e procedimentos simplificados para startups
Essa é uma das principais novidades do decreto para startups. O decreto prevê que ANPD poderá editar normas, orientações e procedimentos simplificados e diferenciados – inclusive quanto aos prazos – para que microempresas e empresas de pequeno porte, bem como “iniciativas empresariais de caráter incremental ou disruptivo que se autodeclarem startups ou empresas de inovação”, possam adequar-se a Lei.
Como a maioria dos modelos de negócio disruptivos utilizam dados pessoais em seus produtos e serviços, a sobrevivência das startups de tecnologia estava ameaçada pelo curto tempo de adequação e pelo alto custo de implementação das obrigações instituídas pela LGPD. Obrigações tais como contratar de um(a) profissional encarregado de dados (denominado DPO – Data Protection Officer pela GDPR) para comunicação entre o titular dos dados e a ANPD; assegurar o exercício dos direitos dos usuários, ou seja, das pessoas que são titulares dos dados pessoais; utilizar de tecnologia de ponta em segurança da informação; além de implementar um programa de processos de governança que permita comprovar que todas as medidas foram tomadas para proteger os dados pessoais coletados. Tudo isso implica em custos, muitas vezes demandando até mesmo consultorias especializadas, nem sempre acessíveis por empresas menores.
O mercado deve ficar atento aos próximos passos da ANPD e como serão implementados os procedimentos simplificados para startups.
5. Decisões Automatizadas
No texto original da LGPD os titulares dos dados teriam o direito de solicitar a revisão, por uma pessoa natural, de decisões tomadas unicamente com base no tratamento automatizado de dados pessoais que afetassem seus interesses, inclusive de decisões destinadas a definir o seu perfil pessoal, profissional, de consumo e de crédito, ou aspectos de sua personalidade. Isso significa o direito de pedir que um ser humano revise uma decisão tomada por um algoritmo para decidir questões como o limite do cartão de crédito ou sobre a exclusão de um perfil por ter ferido a política de uma rede social.
A necessidade dessa revisão ser realizada por agente humano foi retirada pela Medida Provisória 869/2018, mas reintroduzida no texto final da lei 13.853/19 que seguiu para a sanção presidencial. No entanto, o Presidente vetou o referido texto sob o argumento de que a proposta contraria o interesse público, pois inviabilizaria modelos de negócio atuais de muitas empresas, inclusive startups. Alegou ainda que haveria impacto na análise de risco de crédito e de novos modelos de negócios de instituições financeiras, com efeito negativo na oferta de crédito aos consumidores, com reflexos nos índices de inflação e na política monetária.
Este tem sido um dos pontos mais criticados pelos especialistas, que acreditam que a utilização de algoritmos nesses processos decisórios são pouco transparentes e podem ocasionar prejuízos discriminatórios aos titulares dos dados, que não terão mais o direito de solicitar a revisão da decisão por uma pessoa humana.
Embora os titulares dos dados continuem com o direito de solicitar a revisão das decisões automatizadas, estas revisões não precisarão necessariamente ser realizadas por agentes humanos, até porque no cenário de big data muitas vezes torna-se impossível reconstituir todos os passos das decisões algorítmicas.
Como os princípios que norteiam a LGPD são o espírito da lei, cabe às empresas, atendendo ao princípio da transparência, garantir aos titulares informações claras, precisas e facilmente acessíveis sobre a realização do tratamento de seus dados pessoais, observados os segredos comercial e industrial.
Ou seja, ao se deparar com uma solicitação de revisão, além de atendê-la, a empresa deverá também esclarecer as informações que lastrearam a decisão, quais as categorias dos dados utilizadas, como a informação foi utilizada para a tomada de decisão que afetou o titular e tudo o mais que for possível esclarecer, respeitando o segredo comercial e industrial.
Principais desafios:
1. O grau de autonomia e independência da ANPD
A ANPD foi instituída como parte da administração pública federal, integrante da Presidência da República. Isto quer dizer que o órgão não será independente e estará subordinado aos interesses do governo federal. A lei afirma que esta natureza da ANPD é transitória, pois em 2 anos o Poder Executivo poderá transformá-la em uma Autarquia da administração pública indireta, mas não há garantias uma vez que esta decisão será tomada a critério do Poder Executivo.
O grau de autonomia da ANPD é um ponto crucial na aceitação do Brasil como país adequado para o recebimento de dados oriundos do território europeu. Caso o Brasil não seja considerado um país com o mesmo nível de proteção de dados da UE, por conta da falta de independência de nossa autoridade de proteção de dados, as startups brasileiras que atuarem em território europeu terão que enfrentar todos os requisitos burocráticos previstos na GDPR para transferência internacional de dados, dificultando a inserção de soluções de startups brasileiras em mercados externos.
2. A obrigação de nomear um encarregado
A nova redação do art. 5º, VIII, da LGPD diz que tanto o controlador (responsável por determinar o tratamento dos dados) como o operador (responsável por tratar o dado em nome do controlador) deverão indicar um encarregado para atuar como canal de comunicação entre estes, os titulares dos dados e a ANPD.
Ter um profissional encarregado – o(a) DPO – seria, inicialmente, obrigação apenas da empresa controladora dos dados. No entanto, a redação atual ficou confusa ao incluir o operador como responsável por tal indicação, recaindo assim mais uma custosa obrigação sobre as startups que atuam tratando dados em nome de outras empresas, ainda que seja difícil determinar quando uma empresa atua exclusivamente como operadora de um dado pessoal.
Conclusão
Proteção de dados não é diferencial. Proteção de dados é um direito e é lei. Nunca se falou tanto sobre esse tema. Não por menos, após diversos escândalos de vazamento de dados por grandes empresas como Google, Facebook, e até mesmo seu uso com a finalidade de influenciar importantes processos democráticos, o mundo passou a estabelecer normas para proteção dos dados pessoais. A privacidade deixou de ser um tema de nicho e está nas discussões nas mais diversas áreas.
Entendemos que a LGPD não vai matar a inovação e nem é inimiga das startups. Pelo contrário, traz vantagens, como dar clareza sobre as regras do jogo, ao criar uma regulamentação comum que deve ser seguida por todas as empresas durante a coleta, armazenamento, tratamento e compartilhamento de dados pessoais. Ela torna o Brasil apto a processar dados oriundos de países que exigem um nível de proteção de dados mais elevado e institui novas autorizações para o tratamento de dados pessoais, além do consentimento já previsto no Marco Civil da Internet.
O texto final da LGPD contemplou muitos dos pleitos levantados pelas entidades representativas de startups durante o processo legislativo, tornando sua aplicação mais flexível para estas empresas que fomentam boa parte do desenvolvimento econômico atual do país e permitem que o Brasil seja um celeiro de inovação para o mundo.
Além disso, obriga que todos criem soluções inovadoras para sobreviver. O novo panorama é promissor para aqueles que saírem na frente e investirem em segurança de dados e privacidade. Quem insistir em se manter agarrado a paradigmas ultrapassados, ficará para trás. No fim, é para toda a sociedade que a lei será aplicada, seja você pessoa física ou jurídica, a segurança dos seus dados e dos dados pessoais que você utiliza para fins econômicos são também sua responsabilidade.
*Com colaboração de Raíssa Moura, advogada corporativa, head of legal & privacy counsel da In Loco, membro da IAPP – International Association of Privacy Professionals, co-fundadora do Recife Legal Hackers. Formada em Legal Law Master em Direito Corporativo pelo IBMEC e especialização em Gestão de Departamentos Jurídicos pelo Insper. Certificada pela EXIN através do exame PDPE – Privacy and Data Protection Essentials.
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